Sexta-feira sangrenta: por que 55 anos depois não se sabe quantos morreramblaze 777repressão a estudantes no Rio:blaze 777

Exército brasileiro busca conter as manifestações

Crédito, Arquivo Nacional

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Militares brasileiros tentando conter as manifestações

Segundo o documento, foram três militantes, todos civis, que morreram na Sexta-feira Sangrenta. Mas apenas uma, a comerciária Maria Ângela Ribeiro,blaze 77722 anos, morreu durante a manifestação — “morta a tiros pela polícia”, como enfatiza o relatório.

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Com apenas 15 anosblaze 777idade, o comerciário Fernando da Silva Lembo morreu no Hospital Souza Aguiarblaze 7771ºblaze 777julho daquele ano. Ele foi para ali levado, segundo o texto “depoisblaze 777ter sido atingido por disparoblaze 777armablaze 777fogo,blaze 77721blaze 777junho, durante uma manifestação pública no centro do Rioblaze 777Janeiro”.

De acordo com o relatório da Comissão da Verdade, o terceiro óbito relacionado ao episódio ocorreriablaze 7775blaze 777agosto.

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Na data, o estudante e comerciário Manoel Rodrigues Ferreira,blaze 77722 anos, morreu no Hospital Samaritano. Ele havia sido transferido para lá depoisblaze 777passar por duas outras instituiçõesblaze 777saúde e ter se submetido a uma cirurgia. Ferreira havia tomado dois tiros na cabeça durante a repressão.

Professor na Fundação Escolablaze 777Sociologiablaze 777São Paulo e da Escola Superiorblaze 777Propaganda e Marketing (ESPM), o sociólogo Paulo Niccoli Ramirez explica à BBC News Brasil que a dificuldadeblaze 777se chegar ao número corretoblaze 777vítimas é devido à própria faltablaze 777transparência da ditadura militar.

“Em primeiro lugar, havia uma censura. Em segunda, os militares não queriam difundir o número exato [de vítimas] para não gerar uma maior insatisfaçãoblaze 777relação ao regime, com base no que poderia circular inclusive nos meiosblaze 777comunicação”, avalia Ramirez.

Para o historiador Victor Missiato, pesquisador do Grupo Intelectuais e Política nas Américas, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e professor do Colégio Presbiteriano Mackenzie Tamboré, “o númeroblaze 77728 mortos é muito incerto, muito impreciso”.

“Não estou aqui corroborando a versão oficial dos três mortos, mas sim colocandoblaze 777perspectiva o tema. A identificação dessas pessoas é muito imprecisa e dizer que éblaze 777acordo com informaçõesblaze 777hospitais é algo muito impreciso”, afirma ele, à BBC News Brasil.

Missiato arrisca que o número totalblaze 777vítimas tenha ficado entre três e seis. “Próximo à versão oficial me parece verossímil”, aponta ele, citando que os dados dos hospitais da época não são precisos e “daí vem a dificuldadeblaze 777precisar esse númeroblaze 777mortosblaze 777uma épocablaze 777que era completamente cabível a investigação do númeroblaze 777óbitos desse tipoblaze 777evento”.

O que foi o episódio

Os ânimos se acirraram a partir do dia 18blaze 777junho, quando o líder estudantil Jean Marc von der Weid acabou preso ao fimblaze 777uma passeata.

Nova manifestação estudantil ocorreu no dia 19, com repressão violenta por parte da polícia.

No dia seguinte, estudantes da Universidade Federal do Rioblaze 777Janeiro se reuniram e forçaram um debate com o reitor. Na saída do encontro, policiais os aguardavam. Entre golpesblaze 777cassetetes e outras demonstraçõesblaze 777força e violência, cercablaze 777300 foram detidos — e há relatosblaze 777que sofreram espancamentos.

O cenário estava formado. Naquele contextoblaze 777ditadura militar, a revolta estudantil se voltava contra o regime. Mas não só. Era 1968 e ventosblaze 777manifestações semelhantesblaze 777outras partes do mundo também sopravam no Brasil.

“Os movimentos sociais do Brasil daquele ano estão inseridos dentroblaze 777um ano muito específico e especial para os movimentos sociais do mundo afora. Estão interligados a uma criseblaze 777paradigmas, tanto a crítica ao socialismo quanto à crítica à invasão estadunidense ao Vietnã e, principalmente, os movimentosblaze 777crítica às instituições mais tradicionais”, contextualiza Missiato.

“Esses atos representam um anoblaze 777transformações, com críticas às grandes narrativas daquele momento, tanto no sistema soviético como no sistema capitalístico global”, acrescenta ele.

“No caso do Brasil, essas manifestações se inserem na crítica ao sistema militar que, quatro anos depoisblaze 777instaurado, já contava com uma percepção inicial modificada. Então era crítica ao regime e lutava pela democracia.”

Ramirez ressalta que “o anoblaze 7771968 foi muito importante no mundo inteiro”, com manifestações iniciadas na França e, depois nos Estados Unidos, “inflamando também os estudantes brasileiros a tomarem uma atitude maisblaze 777oposiçãoblaze 777relação à ditadura militar”.

Ele lembra que o cenário pós-1964, com crescente censura e o visível não retorno à democracia “como havia sido prometido pelos militares” somou-se à demandas que existiam como lutas “pelas liberdades sexuais e mais espaço para mulheres no mercadoblaze 777trabalho”.

Os estudantes universitários eram protagonistas deste debate. E, ao mesmo tempo, se tornaram alvo dos militares.

“Foram muitas prisõesblaze 777estudantes, líderes acadêmicos. E isso contribuiu para aumentar mais e mais a contestação do público estudantil”, explica Ramirez.

Além disso, o sociólogo lembra que havia também demandas próprias da classe estudantil.

Em um Brasil que se tornava mais urbano, a quantidadeblaze 777vagas nas universidades públicas não acompanhava esse crescimento.

“Além do mais, professores foram aposentadosblaze 777forma compulsória pela ditadura. Os estudantes estavam muito distantes do apoio do governo federal”, afirma ele.

A fatídica sexta-feira

Era o caldo que estava preparado. “E a Sexta-feira Sangrenta foi uma espécieblaze 777ápice desse descontentamento”, define Ramirez. “No fim das contas, os jovens resolveram se rebelar e isso,blaze 777alguma forma, inflamou uma parte do resto da população civil. O resultado foi uma batalha campal entre estudantes e policiais, com direito a pedras arremessadas contra eles.”

Na manhã daquele dia 21, o que era para ser uma nova passeata dos estudantes contra a ditadura no centro do Rio acabou já começandoblaze 777climablaze 777guerra. Munidosblaze 777rolhas e bolinhasblaze 777gude, os estudantes armaram um obstáculo aos cavalos do policiamento, fazendo com que eles tombassem.

De um lado vinham os tiros, do outro o revide com pedras. Até helicópteros foram utilizados para arremessar bombasblaze 777gás lacrimogêneo. No início da tarde, a confusão já estava espalhada por boa parte do centro do Rio.

Manifestantes socorrem um ferido no episódio conhecido como Sexta-feira sangrenta

Crédito, Arquivo Nacional

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Manifestantes socorrem um ferido no episódio conhecido como Sexta-feira sangrenta

A batalha só terminou à noite. Com o saldo até hoje imprecisoblaze 777mortos e feridos.

Um dos fotojornalistas que registraram o episódio — suas imagens foram publicadas pelo Jornal do Brasil, onde ele atuava —, Evandro Teixeira comentaria anos mais tarde que aquele havia sido “um dos dias mais sangrentos que […] o Rioblaze 777Janeiro viveu, nesta época”.

“O Jornal do Brasil era o palco das reações. Tudo começavablaze 777frente ao jornal, que neste dia foi fechado a bala. A polícia começou a atirar e a fechar as portas”, relembrou ele,blaze 777depoimento ao próprio Jornal do Brasil.

“Eu participei ativamente com barreiras, fugindo das cavalarias, vendo estudante caindo. Inclusive tenho a foto do fotógrafo Rubem Seixa, do Correio da Manhã, quando a polícia o surrou depoisblaze 777ter quebrado seu equipamento.”

Ditadura reforçada

A Sexta-feira Sangrenta foi um dos antecedentes que motivariam, cinco dias depois, a famosa Passeata dos Cem Mil, uma manifestação que reuniu artistas, intelectuais e formadoresblaze 777opinião, todos nas ruas contra a ditadura militar.

Do outro lado, o governo também reagiu com firmeza. O crescente climablaze 777oposição acabou sendo contra-atacado com mais repressão.

“O estadoblaze 777exceção, no final das contas, promoveu uma censura generalizada. Não que isso já não ocorresse desde 1964, mas a partir do fimblaze 7771968, o AI5 [Ato Institucional número 5,blaze 77713blaze 777dezembroblaze 7771968, o quinto dos 17 decretos emitidos pela ditadura] deu legitimidade jurídica, infelizmente, para que os militares agissem da forma mais severa possível, não só contra estudantes, mas também contra a imprensa”, comenta Ramirez.

“Assim, essas manifestações como as que ocorreram no Rio foram o estopim para que a ditadura se tornasse,blaze 777forma escancarada, mais violenta”, afirma o sociólogo.