Sem-teto têm direito11 sportsdormir11 sportsespaços públicos? O caso no Supremo dos EUA:11 sports
A administração11 sportsGrants Pass pediu que a Suprema Corte revisasse a decisão e foi apoiada por políticos dos Estados afetados, tanto republicanos quanto democratas, que querem maior autonomia para lidar com a crise e remover pessoas das ruas sem o risco11 sportsviolar a lei.
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Um pronunciamento final da Suprema Corte é esperado apenas a partir11 sportsjunho, mas o caso já é considerado um dos mais importantes deste ano no tribunal.
Se a decisão do tribunal11 sportsapelações for derrubada, o impacto mais imediato será na Costa Oeste.
Porém, se for mantida, cidades11 sportstodo o país poderão ser processadas ao aplicar punições contra pessoas11 sportssituação11 sportsrua diante da ausência11 sportsleitos11 sportsabrigo suficientes.
"Este é sem dúvida o caso mais importante relacionado a pessoas11 sportssituação11 sportsrua a chegar à Suprema Corte desde que os juízes derrubaram leis antivadiagem, nas décadas11 sports1970 e 1980", diz à BBC News Brasil Jeffrey Selbin, professor11 sportsDireito da Universidade da Califórnia11 sportsBerkeley.
"Na verdade, muitos dos tipos11 sportsleis agora contestados no âmbito deste caso são versões modernas11 sportsleis antivadiagem, aprovadas nas últimas décadas pelas cidades especificamente para punir pessoas sem-teto."
De um lado do debate, estão os direitos das pessoas11 sportssituação11 sportsrua11 sportsse abrigar11 sportslocais públicos quando não têm outra opção.
Do outro, está que tipo11 sportspoder as autoridades locais devem ter para estabelecer regras sobre o que é permitido11 sportssuas ruas e restringir acampamentos11 sportssem-teto.
São questões consideradas urgentes11 sportsmeio a uma crise11 sportsfalta11 sportsmoradia.
Segundo o Departamento11 sportsHabitação e Desenvolvimento Urbano dos Estados Unidos, 653 mil pessoas estavam11 sportssituação11 sportsrua no país11 sports2023, um aumento11 sports12%11 sportsrelação ao ano anterior.
"A questão é se o governo pode punir pessoas que estão involuntariamente11 sportssituação11 sportsrua por11 sportsmera presença11 sportspúblico, quando elas não têm para onde ir", explica Selbin, autor11 sportsvários estudos sobre as respostas11 sportsgovernos aos sem-teto.
O que dizem os dois lados da questão
A defesa11 sportsGrants Pass diz que "não há nada11 sportscruel ou incomum"11 sportsmultas por violações à proibição11 sportsacampar11 sportsespaços públicos.
Também afirma que a decisão do tribunal11 sportsapelações contribuiu para o crescente problema11 sportsacampamentos na Costa Oeste, ao criar obstáculos judiciais que impedem respostas a uma "tragédia humanitária".
"[As decisões] estão, na verdade, prejudicando as mesmas pessoas que pretendem proteger", afirmam os advogados.
Na petição à Suprema Corte, a advogada Theane Evangelis e os outros membros da equipe dizem que "as consequências são terríveis para aqueles que vivem dentro e perto dos acampamentos".
Entre essas consequências, ela cita "crimes (incluindo um aumento 'chocante'11 sportshomicídios e agressões sexuais contra sem-teto), incêndios, ressurgimento11 sports'doenças medievais' (como tifo) nos acampamentos, danos ambientais (com enormes quantidades11 sportsdetritos, agulhas e excrementos) e 'níveis recorde'11 sportsoverdoses fatais11 sportsdrogas e mortes nas ruas".
Mas os advogados dos sem-teto dizem que as decisões do tribunal11 sportsapelações não impedem as cidades11 sportsresponder à crise e são consistentes com décadas11 sportsprecedentes da Suprema Corte.
Eles defendem ainda que não há necessidade11 sportsrevisar o caso.
"Durante anos, os líderes políticos optaram por tolerar os acampamentos11 sportsvez11 sportsresponder11 sportsforma significativa à grave escassez11 sportshabitação na Costa Oeste", diz a petição assinada pelo advogado Edward Johnson e outros membros da equipe.
Eles alegam que as cidades da Costa Oeste "ignoraram investimentos11 sportscapacidade11 sportsabrigo, habitação, serviços11 sportssaúde mental e tratamento11 sportsdependência" até que o problema da população sem-teto chegou a um ponto que não era mais "controlável ou tolerável para os eleitores".
"À medida que a crise se agravou, enfrentaram intensa reação pública por suas políticas fracassadas, e é mais fácil culpar os tribunais do que assumir a responsabilidade11 sportsencontrar uma solução", afirmam.
Calcula-se que mais11 sports40%11 sportstodos os sem-teto dos Estados Unidos vivam nos nove Estados que fazem parte da jurisdição do Tribunal11 sportsApelações para o 9º Circuito.
Só na Califórnia, um dos Estados mais afetados, estima-se que mais11 sports170 mil pessoas estejam11 sportssituação11 sportsrua.
Há vários motivos por trás da crise: desde escassez11 sportshabitação a preços acessíveis e desigualdade11 sportsrenda até dificuldades11 sportsacesso a tratamento11 sportssaúde mental e dependência11 sportsdrogas. A pandemia também agravou a situação.
Muitas pessoas dormem na rua, ao relento, outras dentro11 sportsseus carros ou11 sportsbarracas improvisadas11 sportslocais públicos.
Em alguns casos, estas pessoas se recusam a ir para abrigos, mas,11 sportsvárias cidades, a oferta11 sportscamas é menor do que a demanda.
Os detalhes do caso levado à Suprema Corte
O caso diante da Suprema Corte é denominado "Grants Pass versus Johnson" e teve origem11 sports2013, quando a cidade começou a aplicar leis que proibiam acampar11 sportslocais públicos.
A proibição valia até para pessoas sem barracas, mesmo que usassem apenas um cobertor para se proteger do frio ao dormir na calçada, e também para quem passasse a noite no carro11 sportsum estacionamento.
Quem descumprisse as leis não era preso ou processado criminalmente, mas estava sujeito a multa. Com duas infrações, poderia ser banido do espaço público por um período11 sports30 dias.
Grants Pass não tinha abrigos para sem-teto, apenas dois pequenos programas habitacionais administrados pela iniciativa privada, um deles exclusivo para menores11 sports18 anos.
Esses locais eram insuficientes para atender uma população11 sportsrua estimada11 sportscerca11 sports600 pessoas.
Foi nesse contexto que,11 sports2018, três pessoas11 sportssituação11 sportsrua moveram uma ação coletiva11 sportsnome11 sportstodos os sem-teto da cidade, alegando que essas leis representavam "punição cruel e incomum" e, portanto, eram inconstitucionais.
Uma das autoras, que morreu antes do desfecho do caso, era uma mulher que dizia ter ficado "involuntariamente sem-teto" após perder o emprego e a casa.
Ela afirmava ter acumulado, ao longo dos anos, uma dívida11 sportsquase US$ 5 mil (R$ 24,9 mil)11 sportsmultas.
Os autores da ação alegavam que Grants Pass estava tentando forçar pessoas11 sportssituação11 sportsrua a se mudarem para outra cidade.
Diziam também que a aplicação das leis, combinada com a falta11 sportsabrigos, "criminalizava a existência"11 sportsindivíduos que não tinham para onde ir.
Um tribunal aceitou esses argumentos e proibiu Grants Pass11 sportsaplicar as proibições durante a noite.
Durante o dia, passou a ser exigido um aviso prévio11 sports24 horas antes11 sportsqualquer punição.
O caso então chegou ao Tribunal11 sportsApelações para o 9º Circuito, que cobre a Costa Oeste dos Estados Unidos.
Em 2022, por dois votos contra um, os juízes concordaram que as proibições violavam a Constituição, já que não havia abrigos com capacidade para atender a população11 sportsrua.
O painel decidiu que Grants Pass não poderia multar indivíduos "pelo simples ato11 sportsdormir na rua com proteção rudimentar contra os elementos, ou por dormir11 sportsseus carros à noite, quando não há outro lugar na cidade para onde possam ir".
A decisão valia para todos os Estados sob a jurisdição do tribunal.
Quatro anos antes, o mesmo tribunal11 sportsapelações já havia tomado uma decisão semelhante no caso "Martin versus Boise", relativo à capital11 sportsIdaho.
Naquela decisão, os juízes decidiram que pessoas11 sportssituação11 sportsrua não podem ser criminalizadas por dormir11 sportslocais públicos se não tiverem outra opção11 sportsabrigo, porque isso seria "punição cruel e incomum" e inconstitucional.
A nova decisão ampliou esse argumento, englobando não somente punição criminal, mas também sanções civis.
Quando Grants Pass pediu que o caso fosse reconsiderado, a solicitação foi negada por 14 votos contra 13, e a cidade recorreu então à Suprema Corte.
Aliança inusitada
Entre os mais11 sports50 líderes e organizações que apoiaram a petição11 sportsGrants Pass à Suprema Corte estão o governador democrata da Califórnia, Gavin Newsom, as prefeitas democratas11 sportsLos Angeles, San Francisco e Phoenix e mais11 sports20 procuradores-gerais estaduais republicanos.
Na atual composição, a Suprema Corte tem maioria11 sportsseis juízes na chamada ala conservadora (indicados por presidentes republicanos) e três na ala liberal (indicados por presidentes democratas).
Com isso, analistas na imprensa americana consideraram irônico que governantes democratas que várias vezes discordaram publicamente11 sportsdecisões da maioria conservadora da Suprema Corte sobre outras questões, como o aborto, façam apelos a estes mesmos juízes.
"Eles se encontram na posição inusitada11 sportsesperar que o tribunal superior conservador anule (a decisão) do Tribunal11 sportsApelações para o 9º Circuito, geralmente mais liberal, e lhes permita agir11 sportsforma mais agressiva contra acampamentos11 sportssem-teto", diz um artigo publicado no site Politico.
Ao pedir mais poder para penalizar pessoas11 sportssituação11 sportsrua, esses políticos democratas também se encontram na incômoda situação11 sportsbrigar na Justiça com grupos progressistas que costumam ser aliados11 sportsoutros temas, mas que, neste caso, estão no lado oposto, defendendo a posição dos sem-teto.
O governador da Califórnia disse que acampamentos11 sportssem-teto criam "condições perigosas e insalubres para quem vive neles e para as comunidades ao redor" e que as decisões do tribunal11 sportsapelações deixaram os governos "de mãos amarradas" para combater a crise, apesar11 sportsbilhões11 sportsinvestimentos.
"Governantes eleitos da Califórnia que procuram,11 sportsboa-fé, melhorar o que muitas vezes parece ser uma crise intratável, encontram-se sem opções, forçados a abandonar os esforços para tornar os espaços ocupados por pessoas sem-teto mais seguros para aqueles que estão dentro ou (vivem) perto deles", afirmou Newsom11 sportsdepoimento por escrito apoiando a petição11 sportsGrants Pass.
"A Suprema Corte pode agora corrigir o rumo e acabar com os dispendiosos atrasos decorrentes11 sportsações judiciais que têm prejudicado os nossos esforços para limpar acampamentos e prestar serviços aos necessitados."
Selbin, da Universidade da Califórnia, questiona o argumento11 sportsque a decisão do tribunal11 sportsapelações deixou os governos11 sports"mãos atadas".
"Apesar das alegações dos políticos11 sportscontrário, o vasto conjunto11 sportsleis11 sportssaúde e segurança públicas permanece intocado pelas decisões dos tribunais inferiores", afirma.
"As autoridades locais ainda podem prender e processar pessoas por qualquer outra violação da lei, inclusive por crimes contra pessoas e propriedades. Os que alegam que estes casos significam que não podem processar atos11 sportsviolência, consumo11 sportsdrogas ilegais ou roubo simplesmente não estão dizendo a verdade."
O professor11 sportsDireito ressalta também que a decisão não impede autoridades11 sportsevacuar acampamentos, desde que cumpram outras leis básicas, como respeitar o direito dos indivíduos11 sportsnão ter seus pertences destruídos, "o que comumente ocorre".
Para Selbin, um aspecto muitas vezes esquecido é que os casos levaram governos estaduais e locais a dedicar mais recursos para resolver o problema dos sem-teto, incluindo iniciativas para levar indivíduos para abrigos ou moradias e aumentar o número11 sportsleitos.
"Por mais que as autoridades se queixem11 sportsque estão11 sportsmãos atadas, foram forçadas a abrir um pouco o bolso para fazer mudanças significativas", observa.
"Há um longo caminho a percorrer, mas isso é algo bom, que será prejudicado se a Suprema Corte anular a decisão11 sportsGrants Pass."