Como Cuba passou pelo colapso da URSS e sobreviveu como último bastião do comunismo no Ocidente:blaze futebol
Os jovens aprendidam o russo como segunda língua (o inglês era proibido) e as crianças assistiam a desenhos animados que quase ninguém entendia: Cheburashka, o Urso Misha, Lolek e Bolek.
Alunos que se destacassem ganhavam como prêmio viagens à Cracóvia ou a Leningrado.
Já os militares exibiam tanques T-55 e fuzis AKMblaze futeboldesfiles, enquanto outdoors anunciavam a "amizade irrevogável e eterna" entre os povosblaze futebolCuba e da URSS.
Mas, diferente da promessablaze futeboleternidade, a própria União Soviética teve seu fim, e com isso, Cuba passou a viver uma faseblaze futebolincertezas.
Ecos na ilha, 30 anos depois
Jáblaze futebol1989,blaze futebolum discurso dramático, Castro previu que eles poderiam acordar um dia sem a União Soviética.
"Se amanhã ou qualquer dia acordarmos com a notíciablaze futebolque se criou uma disputa civil na URSS, ou mesmo acordarmos com a notíciablaze futebolque a URSS se desintegrou — o que esperamos nunca aconteça, mesmo nessas circunstâncias —, Cuba e a Revolução Cubana continuariam lutando e continuariam resistindo!", disse eleblaze futebol26blaze futeboljulhoblaze futebol1989.
Àquela altura, como um efeito dominó, as velhas repúblicas socialistas haviam embarcado no trem da mudança e, no finalblaze futebol1991, Cuba era praticamente o último reduto da Guerra Fria no Ocidente.
Continuou assim por mais três décadas, mas os ecos daqueles dias ressoam até hoje na vida cotidiana da ilha.
"Hoje, é mais necessário do que nunca discutir esse processo histórico que acabou com a perestroika (reforma que culminou no colapso da URSS), porque há semelhanças hoje entre a própria estrutura cubana e esse processo que aconteceu na URSS", analisa o historiador Ariel Dacal, autorblaze futebolRusia, del socialismo real al capitalismo real ("Russia, do socialismo real ao capitalismo real",blaze futeboltradução livre).
"A classe trabalhadora cubana enfrenta hoje emergências semelhantes às vividas pela União Soviética há 30 anos, mas também uma crise estrutural parecida: econômica, política,blaze futebolparadigma, tudo."
Uma amizade improvável
Uma das questões do século 20 sobre a qual os historiadores ainda debatem é como explicar a "amizade irrenunciável" que surgiu entre a Cubablaze futebolCastro e a URSS, separadas por 10 mil quilômetros, culturas, línguas e tradições radicalmente diferentes.
Embora na produção acadêmicablaze futebolCuba tradicionalmente diga-se que houve uma ligação histórica com a URSS, a verdade é que Castro, antesblaze futebolchegar ao poder, nunca demonstrou simpatia pelo comunismo soviético nem se declarou socialista — tampouco seus seguidores, inicialmente.
"A base da Revolução Cubana não foi socialista. O próprio Castro não poderia dizer que foi um socialistablaze futebolseus primórdios", aponta o historiador britânico Mervyn Bain, professor da Universidadeblaze futebolAberdeen e autorblaze futebolMoscow and Havana 1917 to the Present ("Moscou e Havana 1917 ao presente", tradução livre).
Dacal lembra que a forma como Castro chegou ao socialismoblaze futebolinspiração soviética é complexa e tem a ver com as circunstâncias pelas quais passava a ilha, alémblaze futebolsua relação com os Estados Unidos.
"É um processo que deve ser visto por duas perspectivas, a dos interessesblaze futebolCuba e a dos interesses da União Soviética. À medida que cresce a pressão dos Estados Unidos para sufocar a revoluçãoblaze futebolqualquer maneira, Fidel vê a URSS como uma aliada, como um apoio econômico. E a União Soviética vêblaze futebolCuba uma tremenda oportunidade, porque Cuba está a maisblaze futebol9 mil quilômetrosblaze futebolMoscou, mas a apenas 150 quilômetros do principal inimigo da União Soviética", afirma.
Bain acredita que se estabeleceu uma relação basicamente utilitária entre os dois países, na qual a URSS se tornou a baseblaze futebolsobrevivênciablaze futebolCuba, e a ilha um lugar estratégico para Moscou mostrarblaze futebolinfluência no quintal dos Estados Unidos.
Segundo o historiador britânico, também havia elementos do modelo soviético que talvez atraíssem Castro emblaze futebolaspiraçãoblaze futebolcriar uma nova sociedadeblaze futebolCuba.
Sebastián Arcos, diretor assistente do Institutoblaze futebolPesquisa Cubana da Universidade da Flórida, acredita que o modeloblaze futebolcomando soviético e o culto a seus líderes também chamou a atençãoblaze futebolFidel enquanto novo líder.
"Fidel Castro foi um grande estrategista, era como um jogadorblaze futebolxadrez que está sempre três jogadas à frente. Ele viu que assumindo esse modelo, também garantiriablaze futebolpermanência no poder, como fizeram Stalin e os demais dirigentes soviéticos, que ficaram no poder até a morte. Para ele, tratava-se disso,blaze futebolmanter o poder — algo que uma sociedade democrática não teria permitido", afirma Arcos.
Relações complexas
Entretanto, os pesquisadores entrevistados concordam que as relações entre Moscou e Havana nem sempre foram tão amistosas e festivas quanto a comunicação oficialblaze futebolambos os lados demonstravam.
"Uma importante encruzilhada foi a crise dos mísseisblaze futebol1961, quando a União Soviética e os Estados Unidos decidiram, sem consultar Cuba, retirar os mísseis", recorda Dacal.
Nos anos 1970, as duas nações haviam assinado importantes acordos comerciais e a URSS respondia por 85% do comércio exteriorblaze futebolCuba. A União Soviética era o principal destino do açúcar cubano e também o maior fornecedorblaze futebolpetróleo e bensblaze futebolconsumo para a ilha. Entretanto,blaze futebolmeados dos anos 80, esse cenário começou a mudar.
"Gorbachev assumiu o poderblaze futebol1985. A relação econômica continuou muito forte, mas o governo soviético disse que não enviaria militares a Cuba para defendê-lablaze futebolcasoblaze futebolataque americano", lembra Bain.
"Aí começa o processo da perestroika e da glasnost. É aí que ocorre a grande ruptura, porque Castro não gostou das reformas que Gorbachev começou a implementar e passou a criticar essas políticas."
Gorbachev iniciou um processoblaze futebolrestruturação da União Soviética que a abriu para a economiablaze futebolmercado (perestroika) e que visou ampliarblaze futebol"transparência política" (glasnost), com a eliminaçãoblaze futebolmecanismosblaze futebolcensura.
Arcos lembra que foi neste momento que as publicações soviéticas que até então enchiam as bancas deixaramblaze futebolaparecerblaze futebolCuba.
"Elas (as publicações) foram rapidamente censuradas porque mostravam uma realidade, uma crítica ao sistema — algo que era visto como uma posição reacionária dentroblaze futebolCuba", afirma o pesquisador.
Enquanto a URSS fazia seu processoblaze futebolabertura, Castro implementou medidas que chamoublaze futebol"retificaçãoblaze futebolerros e tendências negativas" — indo para um caminho ainda mais dogmático na implementação do socialismo na ilha.
Em abrilblaze futebol1989, Mikhail Gorbachev visitou Cuba, um evento que foi visto como um aviso das mudanças na URSS que refletiriam na ilha.
"Há uma anedota do encontro entre Castro e Gorbachev na imprensa da época que o descreve como uma 'conversablaze futebolmorte'. Gorbachev diz a Castro: temos que fazer reformas. Castro responde: é o que estamos fazendo aqui. A partir daí, eles praticamente se ignoram", lembra Bain.
Queda do muroblaze futebolBerlim ocultada no Granma
A visitablaze futebolGorbachev a Havana foi seguida pelo rápido colapso da URSS, uma república soviética atrásblaze futeboloutra república soviética se delisgava e se tornava independente.
Em pouco maisblaze futeboldois anos, a grande nação do proletariado fundada sete décadas atrás rapidamente desmoronou.
Tudo começou na Polónia, depois na Hungria, Alemanha Oriental, Bulgária e Romênia...
Os cubanos que apoiavam as reformas na URSS eram chamados pejorativamente na ilhablaze futebol"perestroikos", e quando a URSS realmente colapsou, a mídia oficial cubana passou a falarblaze futebol"desmantelamento", alémblaze futebolpublicar críticas e acusações contra Gorbachev, que era chamadoblaze futebol"traidor" e "agente da CIA".
Em seu livro Cuba fue diferente ("Cuba foi diferente", na tradução livre), o historiador Even Sandvik Underlid diz que naquele período a imprensa cubana se limitou a narrar o ocorridoblaze futebolbreves notas, embora enfatizasse o caos trazido pelo processo.
De acordo com a pesquisa realizada por Underlid, alguns eventos como a queda do Muroblaze futebolBerlim não foram reportados pelo Granma.
"A mensagem da mídia era: olha como eles estão mal, como renunciaram às conquistas. Isso não pode acontecer com a gente", descreve Arcos.
Embora a informação veiculada pelos (únicos) meiosblaze futebolcomunicação oficiaisblaze futebolCuba fosse incompleta, as notícias do que acontecia na URSS acabam chegando à ilhablaze futeboloutras formas.
Segundo Arcos, nas ruas cubanas, a reação às novidades era um mistoblaze futebol"espanto e esperança".
"Espanto porque ninguém jamais pensou que isso pudesse acontecer, inclusive eu. E esperança porque todos pensávamos que Cuba seria a próxima peça do dominó. Eu estava pensandoblaze futeboldeixar Cuba definitivamenteblaze futebol1989 e decidi que não, que não íamos embora porque eu via luz no fim do túnel. Agora olho para trás e digo: 30 anos se passaram e a luz não chegou."
O último bastião
Contrariando grande parte das previsões, o modeloblaze futebolsociedade defendido por Castro sobreviveu ao colapso soviético, apesar do chamado Período Especial, da crise econômica sem precedentes e da fomeblaze futebolque Cuba submergiu após o desaparecimentoblaze futebolseu principal aliado.
Uma das perguntas que este período traz é por que não houve um colapso do socialismo tambémblaze futebolCuba.
Dacal aponta que assumir que o regime cubano cairia logo depois da URSS seria considerar que a ilha era um "satélite" soviético, algo que emblaze futebolopinião nunca foi assim.
Arcos, porblaze futebolvez, acredita que, diferente do que aconteceublaze futeboloutros países quando ocorreu o colapso soviético, Fidel Castro ainda estava vivo eblaze futebolpleno usoblaze futebolseus poderes.
"Ou seja, não há vácuoblaze futebolliderança, não há mudançablaze futebolliderança como ocorreublaze futeboloutros países", opina.
Para o pesquisador, esse poder é justamente o motivo pelo qual Castro não só impôs o socialismo à ilha, mas o manteve a todo custo.
"Aceitar as reformas seria aceitar deixar o poder, fazer eleições, sair do trono. E isso ele nunca teria permitido. Em todos os anosblaze futebolque esteve no poder, ele não fez nada mais do que isso, colocar o seu interesse pessoal acima doblaze futebolseu povo", analisa Arcos.
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